terça-feira, 19 de agosto de 2014

Seguro automóvel é que vai pagar!

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Às vezes o que se quer é gerar polémica e, se considerarmos que grande parte das pessoas que se dá ao trabalho de comentar as notícias só lê as letras gordas, basta arranjarmos uns títulos bombásticos com palavras chave como ciclistas, seguro e responsabilidade, para termos logo uma série de discussões acesas com base em coisa nenhuma.


Vejamos este testemunho fictício:


« É um desporto desgastante.... Por isso, mesmo quando não terminam nos primeiros lugares, gosto de ir ter com eles e dar-lhes uma palmada reconfortante nas costas. Afinal de contas, é bom chegar em primeiro lugar mas, nem sempre ganhar é tudo o que importa »


O significado deste gesto é claro: valorizar quem participa, mesmo que essa participação não implique chegar em primeiro. Mas, ninguém quer saber de uma coisa destas. Como é que podemos então aumentar o número de visualizações , partilhas e comentários desta notícia ?

Sabemos que há um tipo que gosta de dar uma palmada reconfortante nas costas dos participantes. Aquele tap tap tap simpático que significa "Força nisso!". Mas se dissermos que ele bate nas costas dos ciclistas que não chegam em primeiro lugar, também não estamos muito longe da verdade e às tantas, vamos ter um título bombástico que vai levar as pessoas a pensar que há um maníaco na linha das chegadas a agredir os ciclistas que não chegam em primeiro lugar.

O mesmo se tem passado com notícias que têm saído ultimamente e que envolvem carros, seguros, operações STOP e código da estrada. Oculta-se dos títulos o que realmente interessa, e realça-se o que gera polémica. Claro que o resultado final, gera confusão.



Pois é caros ciclistas, no final de Julho, quase de certeza que a maioria de nós se deparou com uma destas pérolas:


«Associações de ciclistas querem seguradoras de carros a pagar acidentes»
(O DRAMA!)

«Seguro automóvel deve pagar por acidentes causados por bicicletas»
( O HORROR !!)


«Seguro automóvel deverá vir a pagar por acidentes causados por bicicletas»
( A TRAGÉDIA!!!)



Confesso que, quando estas notícias começaram a sair, achei a situação um bocado absurda. Uma onda de histeria coletiva parecia ter tomado conta das discussões, e a época de caça às bruxas estava oficialmente aberta e com direito a archotes e forquilhas, como nos bons velhos tempos.

O cenário pitoresco que normalmente pintavam era qualquer coisa como: Era uma vez um ciclista fofinho de quem toda a gente gostava. Era uma espécie de Branca de Neve que pedalava pela cidade a assobiar ao som do canto dos pássaros. Tinha uma pequena horta ali em Telheiras, onde produzia produtos 100% biológicos que depois distribuía pelos mais carenciados. Os vizinhos acham que ele devia ser promovido a santo. Porque era realmente uma pessoa santa, e andava de bicicleta.


No extremo oposto, vivia o automobilista. Uma criatura vil e mesquinha que, como tem carro, de certeza que não tem preocupações ambientais. Como tem carro, é quase certo que anda sempre em excesso de velocidade, a passar vermelhos, a estacionar em cima dos passeios e a não ceder passagem aos peões nas passadeiras. Assim sendo, todo e qualquer acidente que o envolva enquanto condutor será, claro, culpa dele. E isto tudo porque o carro que tem polui, e ele tem é que andar de bicicleta. Mais nada!



Pessoalmente, não sou defensora da postura de que um condutor automóvel, pelo simples facto de conduzir um carro, ser responsável por um acidente causado por alguma manobra kamikaze de um ciclista tresloucado. Pois, porque lá por andar de bicicleta, o ciclista não é automaticamente um exemplo a seguir... basta pararmos ali nos semáforos da Avenida da República para vermos vários exemplos disso.

Há ciclistas e ciclistas. Há automobilistas e automobilistas.
E o facto de estarmos em duas rodas, não faz de nós moralmente superiores.

Claro que há quem defenda que a responsabilidade de qualquer sinistro que envolva carros e bicicletas deverá ser sempre do automobilistas e os argumentos são vários.

« Mas o condutor, como tem carta, tem a obrigação de ter mais atenção ! »
Ah sim ? Então e não há ciclistas com carta de condução ? Esse é um dos argumentos que vem sempre à baila quando se fala do direito a circular na estrada ...

« Ainda assim, o condutor tem de ter mais atenção e estar preparado. Porque tem carro e o carro tem potencial destrutivo » 
Eu também tenho potencial destrutivo quando estou de mau-humor. E nem preciso de carro!  Agora fora de brincadeiras, a verdade é que há situações tão imprevisíveis que, por mais atenção que tenhamos, não conseguimos evitar. Sabem a quantidade de acidentes que há com cães nas auto-estradas? Ou com javalis em estradas rurais ? Podemos antecipar algumas situações de perigo e até adoptar uma condução mais defensiva mas, há situações tão improváveis que nem sequer as ponderamos. Quantas pessoas, quando circulam numa auto estrada pensa: «é melhor ir a 80 km/hora porque... nunca se sabe... pode aparecer um cão abandonado e eu não ter tempo de parar » ou « deixa-me cá reduzir a velocidade porque pode aparecer um cavalo vindo de nenhures »

Adiante.


Estava eu a dizer que se gerou uma onda de loucura e indignação porque ninguém se entendia. As associações de ciclistas diziam, supostamente, uma coisa. O ACP respondia, supostamente, com outra.


E "supostamente" porquê ?

Convido-vos a espreitar os links da MUBI e da FPCUB a respeito deste assunto.


Vão lá. Eu espero.






Já está ? 

Parece que afinal a história não é bem como aparece nas letras gordas....


Afinal ...
« Assim, ao contrário do que tem vindo a ser divulgado na comunicação social com meias verdades suportadas em citações parciais e descontextualizadas, a MUBi não defende qualquer agravamento dos seguros automóveis nem que estes tenham que compensar sempre e de forma definitiva as vítimas. Pelo contrário, caso estas venham a ser responsabilizadas pelo sinistro, cabe à seguradora o direito de vir a ser ressarcida de parte da compensação prestada ao utente vulnerável, em tribunal. » Fonte: MUBI

Afinal...
« A bicicleta é também de entre os veículos que circulam na estrada, um dos que menos acidentes (e com menor gravidade) pode provocar. Também é daqueles meios de transporte que em razão da velocidade que atinge, menos danos corporais provoca (para além de muitas outras vantagens para a sociedade em geral - económicas, ambientais e de saúde pública). Mesmo sem seguro obrigatório, o condutor de velocípede (ou peão) não deixa de ser responsável e os seus bens não deixam de responder por isso. Tal como qualquer cidadão que provoque danos em bens pertencentes a terceiros. » Fonte: FPCUB

Afinal... 
Andou tanta gente histérica por causa de um monte de tretas descontextualizadas.

É o milagre da manipulação. E enquanto se apedrejam uns aos outros nas redes sociais com calhaus virtuais e comentários desvirtuosos, a atenção vai sendo desviada daquilo que realmente importa: a necessidade de melhorar e criar infraestruturas adequadas.

Boas Pedaladas
Costureira Ciclista

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