Muito se tem discutido sobre as opiniões de Carlos Barbosa, Presidente do ACP, às alterações do Código da Estrada. Mas eis que entra um novo peão no jogo: Paulo Pereira de Almeida, um entusiasta da crucificação dos ciclistas a par da deidificação dos automóveis (consta que já está a ser construído um santuário ali para os lados do Entroncamento).
Antes de mais, espreitem o artigo de opinião publicado ontem no Jornal de Notícias cujo título, por si só, já deixa antever o que aí vem:
Se já leram o artigo e são ciclistas, estarão provavelmente a espumar pela boca e a pensar criar um evento no Facebook chamado Vamos Furar os Pneus do Carro do Paulo Almeida.
Se já leram o artigo e são automobilistas, deverão estar a acenar com a cabeça e a concordar que os ciclistas deviam realmente ser banidos das estradas e que estas alterações são uma vergonha que só mostra que "somos um País do terceiro mundo" e afins.
Eu chamo-lhe: manipular para reinar.
Ao contrário da ideia que anda a ser vendida nos media, os automobilistas e ciclistas já coexistem há bastante tempo e têm vindo, aos poucos, a aprender a respeitar-se mutuamente. Não é novidade nem para uns, nem para outros, que há comportamentos a adoptar para garantir a segurança de todos.
Mas isso é algo que passa completamente ao lado deste artigo - e de muitas opiniões que têm sido omitidas - revelador de um genial brilhantismo, e que certamente irá colocar Paulo Pereira de Almeida na corrida às personalidades mais carismáticas e influentes de 2014.
Vamos lá ver:
"só por pura inércia - ou por completo desligamento da realidade de Portugal - se pode vir a introduzir no Código da Estrada medidas que equiparam os ciclistas aos automobilistas, sem pensar minimamente na especificidade do relevo do País (Portugal não é a Holanda, onde grande parte do território é plano e convida ao uso da bicicleta)"
A questão aqui é que não é o "território plano" que "convida ao uso da bicicleta" mas sim, a ciclabilidade da cidade. Ou seja, a existência de medidas (como as alterações ao Código da Estrada) e de infraestruturas que permitam ao utilizador da bicicleta fazer dela o seu meio de transporte prioritário.
Mas já que o autor do artigo entra em comparações com a Holanda, vamos ver as opiniões de alguns estudantes de Erasmus das chamadas cidades planas, publicadas na tese de mestrado de Paulo Guerra dos Santos:
Adam R.: "a subida não é nada de especial"
Leandro Gatti: " "em Lisboa são só subidas e descidas"
De notar que aqui não estamos a falar de uma teoria escrita confortavelmente em frente a um computador sem testar o argumento. O autor desta tese é na verdade um engenheiro civil, também autor do blog 100 dias de bicicleta que, com base na experiência e após um intenso estudo do terreno, pôde concluir que «18 km planos de toda a frente ribeirinha, junta-se o planalto central, uma extensa área praticamente plana, que ocupa mais de metade da área urbana da cidade».
Mas, ainda que o ciclista tenha, efectivamente, algumas subidas pelo caminho, isso não pode, de todo, ser usado como argumento para lhe negar o direito de usufruir do espaço público. Seria o mesmo que vedar o acesso dos automobilistas à Serra da Estrela quando há neve porque, ao contrário do que acontece em países como a Alemanha ou Suécia, os carros não andam equipados com pneus e correntes para a neve e gelo e o terreno assim torna-se perigoso e "não convida" à condução automóvel.
"para acrescentar ainda mais medidas que fazem dos automobilistas uma espécie de "cidadãos de segunda" nas estradas"
Eu acho que esta é a minha afirmação favorita! Adoro a expressão "cidadãos de segunda". A-D-O-R-O! É tão inspiradora que acho que vou começar a utilizá-la no meu dia a dia, em momentos que me sinta particularmente irritada com alguma coisa e me faltem argumentos.
- Mas como assim, não há pães de leite porque o padeiro teve uma folga extra depois do Natal ?!?! SOU ALGUM CIDADÃO DE SEGUNDA ?!?!?!
O direito da igualdade está consagrado na Constituição da República Portuguesa e portanto não há cidadãos de primeira e cidadãos de segunda, sejam eles ciclistas ou automobilistas. As alterações visam promover a partilha da via, tornando-a mais segura para todos os que nela circulam e não, como Paulo Almeida defende, beneficiar uns em detrimento de outros.
O que talvez este brilhante autor desconhece, é que os automobilistas já cumpriam estas normas mesmo antes de existirem.
( e os automobilistas sabem-no bem)
Porquê ?
Porque ao contrário da ideia que tenta passar, ciclistas e automobilistas não são uns selvagens. São cidadãos, com os mesmos direitos e deveres que, por força das circunstâncias ou por opção, escolheram o carro ou a bicicleta.
Porque convivemos, imagine-se, diariamente por esse Portugal fora e, tanto uns como outros, têm vindo a aprender a adoptar uma condução responsável e defensiva.
Mas vamos fazer uma loucura e entrar no campo do ridículo e do absurdo.
(a partir daqui, caros leitores, estão por vossa conta)
A ideia que tenta vender é que, os desgraçados dos automobilistas, são relegados para segundo plano por causa de um punhado de medidas que os afecta.
Estaremos aqui a ignorar que Portugal é o país da Europa com mais auto estradas per capita que, pasme-se, são construídas para ... os automóveis. Incrível! E o estacionamento ? Bom... só em Lisboa existem aproximadamente 50 parques de estacionamento automóvel enquanto que, muitos ciclistas continuam a ter de deixar as bicicletas presas a postes devido à falta de opções.
Mas pronto... fechemos os olhos a esta realidade e continuemos a falar destes usurpadores da estrada que dão pelo nome de ciclistas.
"o legislador (leia-se: o MAI) cria ainda o conceito de "zonas de coexistência" nas cidades; esta é uma verdadeira "pérola" da habitual incompetência legislativa, já que se trata aqui de zonas em que os condutores não poderão circular a mais de 20 km/h..."
Então mas... esperem lá! Já não percebo nada disto.
O Sr. Paulo Almeida considera os automobilistas "cidadãos de segunda" porque, a seu ver, são lesados com as alterações ao Código da Estrada. Contudo considera uma "incompetência legislativa" a criação de zonas de coexistência que visam tornar a cidade num espaço de que todos possam usufruir.
Mas então, ao não criarmos a cidade num local para todos, não estaremos a beneficiar o uso automóvel em prejuízo da utilização por parte de todos ? Isso torna os cidadão que não utilizam o carro em quê ? Cidadãos de quarta ?
Mas vou ser franca (e sei que há leitores que vão ficar furiosos e chamar-me "vira casacas") : aqui concordo consigo e acho que é ABSURDO um carro não poder circular a mais de 20 km / hora nessas tais zonas de coexistência!
Quer dizer... anda uma pessoa a investir dinheiro a comprar um carro de alta cilindrada para poder andar a 250 km/hora numa AE em que o limite é 120 e depois vez o palerma do legislador falar de zonas de coexistência!
Acho que que os carros até deviam poder andar nos passeios! Sim senhor, nos passeios! Aliás, acho que em vez de andarem a gastar dinheiro com a porcaria das ciclovias, deviam construir uns túneis subterrâneos para os peões fazerem a sua vidinha diária (passear com as crianças, ir às compras, ir para o emprego, praticar jogging) e acabar se vez com estas ideias parvas de criar uma cidade para todos. Já não posso ouvir falar de "cidades sustentáveis", "mobilidade urbana" e "diminuição da poluição" !
"Acrescente-se ainda que este Código da Estrada prevê - neste ataque continuado a automobilistas em favor dos ciclistas - que sejam criadas passadeiras especiais para velocípedes, que terão aqui prioridade e nas quais os condutores serão obrigados a ceder passagem"
O HORROR!!!! Já imaginaram o desgaste que isso vai provocar ? É que não são só travões ... É o tempo que se perde! E todos sabemos que 30 segundos podem fazer toda a diferença.
Mas sabe que mais ? Grande parte dos condutores já cede a passagem! Aliás, há uns que até o fazem quando um peão mais aventureiro atravessa fora da passadeira! Chama-se a isso: civismo! Algo que assiste a muitos condutores e ciclistas, apesar de neste artigo se pretender dar a entender o contrário.
"Por fim - e numa medida verdadeiramente "revolucionária" - as bicicletas passam a poder circular na estrada mas podendo dois ciclistas circular em paralelo e ocupar por inteiro uma das faixas de rodagem tornando, portanto, a sua ultrapassagem ainda mais perigosa."
Perigosíssima! Aliás, é muito mais seguro, o ciclista ir encostado à berma (onde existem buracos, detritos e grelhas de escoadouros) e o automobilista tentar passar sem ultrapassar , aumentando consideravelmente o risco de queda e atropelamento.
Creio que, a maior parte dos condutores tem carta de condução, certo ? Ultrapassar não é novidade para eles. Fazem-no diariamente e alguns com bastante destreza. Para quê estar a fazer disto um bicho de sete cabeças ?
Ultrapassar uma bicicleta é perigoso ?!
Então e se for uma mota ? É menos perigoso ?
Parece-me a mim que a manobra é sempre a mesma: sinalizar, mudar de faixa, ultrapassar, sinalizar, regressar à faixa.
"Depois, e em segundo, estranha--se sobretudo a ausência de normas e regras que conduzam realmente a uma estrada mais segura, como seria, por exemplo, o caso dos limitadores e inibidores de condução em veículos pesados e autocarros de transporte escolar "
A cereja no topo do bolo. As alterações ao código da estrada visam tornam a estrada mais segura, para TODOS os que nela circulam e não o contrário.
A solução?
Um passeio por Lisboa de carro e de bicicleta.
Eu já fiz os dois. Será que o autor do artigo também ?
texto de merda. devias ser enrabado pela selecção do senegal.
ResponderEliminarLisboa é uma cidade (das 7 colinas) com relevo relativamente impróprio para o ciclismo como meio de transporte para o comum mortal, a menos que sejamos todos ciclistas de montanha. eu próprio ando de bicicleta e deixo-a em casa para ir trabalhar e ando de transportes pois nem nos próximos 20 anos haverá coexistência entre ciclistas e automóveis com a dimensão que essa cabacinha deve supor.
Como o Paulo Almeida dá a entender, não é que os conceitos em si sejam maus, o que é má é a sua aplicação dentro da nossa realidade.
E curiosamente não fala de nada sobre a obrigatoriadade dos seguros para ciclistas.
Textos pseudo-intelectuais com a mania que temos piada é muito fácil, difícil é tirar as palas dos olhos.
Caro R. Mendes,
EliminarAntes de mais, agradeço o seu contributo para o blog. Como tenho vindo a frisar, é importante que ciclistas e automobilistas expressem as suas opiniões, por mais díspares que sejam, pois só assim podemos conhecer pontos de vista diferentes do nosso.
Tal como o R. Mendes, também eu sou ciclista, deslocando-me diariamente em Lisboa sem ser, no entanto, uma "ciclista de montanha". Pessoalmente, não considero que o relevo seja "relativamente impróprio para o ciclismo como meio de transporte para o comum mortal". No entanto, compreendo que, em alguns percursos, possa ser difícil adoptar a bicicleta como único meio de transporte e aí resta-nos o carro ou, como o R.Mendes faz, os transportes públicos.
Concordo consigo quando refere que a coexistência entre ciclistas e automobilistas demorará algum tempo a atingir a dimensão que vemos em países como a Holanda e é precisamente por esse motivo é que se torna importante debater a questão, e avançar com medidas que contribuam para a mudança do paradigma existente.
Quando ao facto de não abordar, neste artigo, a questão da obrigatoriedade dos seguros para ciclistas, a razão prende-se com o facto deste assunto ter já sido abordado no post « Hostilidades dentro de 3...2...1 » . Deixo deste já o convite para a sua leitura e, claro, para comentar e expor o seu ponto de vista.
http://acostureiraciclista.blogspot.pt/2014/01/hostilidades-dentro-de-3-2-1.html
Abraço
É de facto impossível tirar as palas dos olhos a alguém que usa este tipo de linguagem. Obrigado pelo seu comentário, demonstra de que lado estão os broncos. Felizmente a maioria dos portugueses são pessoas civilizadas e ansiosas de copiar os bons hábitos dos países mais evoluidos,. Se todos fossem como você, estaríamos condenados a que nenhum progresso se adequasse à nossa realidade. E reparei que conhece bem a intimidade da selecção do Senegal
Eliminar"Parece-me a mim que a manobra é sempre a mesma: sinalizar, mudar de faixa, ultrapassar, sinalizar, regressar à faixa."
ResponderEliminarTodo condutor civilizado , consciente pensa assim!
E concordo com você e de forma prática, eu também sei que há civismo, mesmo em lugares onde as condições de trânsito são desfavorecidas para ambos de condutores de carros, bike e pedestres (peões), vivemos a todo momento e ainda mais hoje graças a um movimento, muito além de simples subir numa bike ou bicla,bici há a conscientização dos direito e deveres dos ciclistas em prol justamente da coexistência!
E outra, Além de coexistência temos que nos fazer visíveis, poque? Porque também somos condutores e como tal temos que nos fazer existir tanto para nossa segurança, e fundamentalmente como nosso compromisso por fazemos parte do trânsito.
No Brasil onde se vê muitas adversidade por sua enorme geografia e diversidades regionais ainda se tem muito o que fazer em termos de Leis para ciclistas ( direito e deveres), mas civismo tem sim senhores e mesmo sendo um pais em desenvolvimento ( terceiro mundo) eu acredito que lei não deve ser para beneficiar algum tipo especifico, mas buscando adequar a realidade que hoje é proporcionalmente diferente de 10 anos atrás! Sigamos os exemplos prático e efetivos para todos os condutores!
Beijos brazucas ao ciclistas lusos!
Olá Ellen,
EliminarAntes de mais, muito obrigado pelo teu testemunho! É sempre bastante interessante poder partilhar aqui a opinião de um colega ciclista de "além fronteiras".
Beijos
Que o Paulo seja um ignorante arrogante, sendo professor, já é mau. Pior é um jornal sério como o DN não ter o mínimo cuidado com a qualidade dos artigos que publica
ResponderEliminarCaro R. Mendes. Uma pessoa, de facto, sente-se muito básica no pensamento quando escreve um texto informativo, criativo, julgando que até escreve umas coisas interessantes, e a reacção de quem lê é «texto de merda. devias ser enrabado pela selecção do senegal». Tal afirmação, vinda dos seus dedos, revelam uma prosa do mais precioso requinte, e muito provavelmente A Costureira Ciclista nunca conseguirá atingir o seu refinamento intelectual.
ResponderEliminarPosto isto, apenas um comentário a algo que escreveu: «Lisboa é uma cidade (das 7 colinas) com relevo relativamente impróprio para o ciclismo como meio de transporte para o comum mortal, a menos que sejamos todos ciclistas de montanha.» Anda, pelos visto, muita gente enganada. Diariamente vejo pessoas a usar a bicicleta nas mais diversas partes da cidade, com mais ou menos relevo. Ainda há pouco subi à Ajuda, usando as mudanças mais leves da bicicleta. Ah, claro, mas eu sou campeã olímpica de triatlo e passo 15 horas por semana no ginásio, tinha-me esquecido dessa parte... Agora a sério, ironias à parte, mas o R. Mendes acha mesmo que não se consegue pedalar em Lisboa? O que é um comum mortal? É que vejo tanto crianças como pessoas mais velhas a pedalar sem receios. E quando estão cansados, vão a pé. Simples. Ou será que é o R. Mendes que é tão fraquinho de pernas como é de cérebro?
Atentamente.
L. Alves
Já li e reli o texto do Paulo Almeida e chego à conclusão que o senhor deve ter um trauma em relação às bicicletas...sei lá talvez a primeira vez que pegou numa, partiu-se o selim e ele ficou sentado no espigão.
ResponderEliminarJá li e reli o texto do Paulo Almeida e chego à conclusão que o senhor deve ter um trauma em relação às bicicletas...sei lá talvez a primeira vez que pegou numa, partiu-se o selim e ele ficou sentado no espigão.
ResponderEliminarO Sr. Paulo Almeida devia ler isto, só naquela...
ResponderEliminarhttp://www.thetimes.co.uk/tto/public/cyclesafety/article3755751.ece